Mesmo que você não entenda nada sobre artes marciais, já deve ter escutado falar em Ronda Rousey. A atual campeã peso-galo do UFC é conhecida por derrotar as adversárias em questão de segundos e é o maior nome feminino em um esporte dominado por homens. Recentemente, ela não só ganhou da brasileira Bethe Correia, como também viu o seu discurso feminista sobre “do nothing bitch” (algo como, “mulher que não faz nada”) ser transmitido no show de Beyoncé durante o festival Made in America.
Apesar de ser uma mulher poderosa, ela ainda enfrenta muitos absurdos por ser uma atleta mulher em um meio tão masculino. Mesmo assim, Ronda vem promovendo grandes avanços para mudar a maneira como as mulheres são tratadas na mídia e nos esportes em geral.
Prestes a embarcar para a Austrália, onde luta, em novembro, contra Holly Holm, ela abriu um tempinho na agenda corrida para bater um papo bastante inspirador publicado pela Marie Claire norte-americana.
Ao longo de sua carreira de lutadora, você acaba sempre ganhando em questão de segundos. Como é a sensação de ser uma vencedora tão consistente? Você acha que existe alguma adversária capaz de fazer o que você já faz?
Todas as meninas são incríveis competidoras. A próxima mulher com quem vou lutar, Holly Holm, é 19 vezes campeã mundial de boxe e é a atleta mais condecorada dentro das artes marciais mistas. Então, ela é uma forte adversária que eu vou ter que enfrentar. De alguma forma, as pessoas agem como se eu não tivesse nenhuma concorrente. Mas a questão é que elas são todas tão boas que me obrigam a ser melhor do que eu já pensei ser possível.
Sua adversária é incrível, mas o que se fala é que ninguém consegue te parar. Deve ser muita pressão...
A questão é que eu domino tantas modalidades porque sou a mais assustada e medrosa de todas as lutadoras. Muita gente, uma vez que se torna campeã, relaxa. Eles meio que se acomodam naquela situação e tentam se divertir. Mas eu sinto que tudo aquilo pelo qual eu já trabalhei para conquistar pode se perder a qualquer momento. Eu trabalho cada vez mais duro porque quero sempre ir além em cada nova luta, sem me preocupar com o fato de essas meninas estarem me alcançando. Ninguém é fácil até você vencê-la.
Depois que seus comentários sobre não ter o corpo de uma “mulher que não faz nada” viralizaram, você registrou a frase “do nothing bitch”. O que você pretende fazer com isso?
Bom, primeiro nós criamos uma linha de camiseta que teve parte das vendas revertidas para a clínica de saúde mental Didi Hirsch, que oferece tratamentos gratuitos a crianças com disformia corporal e transtornos alimentares. Levantamos um bom montante de dinheiro para eles e estou pensando em, provavelmente, continuar fazendo algo nesse sentido de meses em meses.
Por que essa causa é importante para você?
Porque são questões com as quais muitas meninas que estão crescendo costumam lidar, mas continua sendo algo muito ignorado e pouco falado. Eu gostaria que fosse diferente para as meninas que estão crescendo depois de mim. Não deveria ser tão difícil quanto foi.
Eu estava em um esporte que exigia um peso baixo, no judô, então eu tinha que estar com um determinado peso em um prazo determinado. Isso meio que me levou a ter uma relação nada saudável com comida na minha adolescência. Eu sentia que se eu não estivesse no peso exato, eu não estaria bonita. Foi muito pesado, e agora eu posso dizer que superei isso e nunca estive tão feliz com a minha aparência e tão satisfeita com o meu corpo. Foi definitivamente uma longa jornada para chegar até aqui.
A sua campanha para o Carl’s Jr. tem recebido uma série de elogios porque é sexy, mas ainda assim não é excessivamente sexual como muitos outros anúncios foram no passado. Por que você decidiu seguir essa linha?
Quando eu era mais nova, a regra que eu estabeleci para mim mesma era a de que eu seria notada pelos garotos que eu queria. Por exemplo, se eu gostasse de um menino de 14 anos e ele lesse a revista Maxim, então eu determinava que eu deveria parecer fisicamente com aquelas meninas da capa da Maxim que ele iria se interessar por mim. Se eu vejo um anúncio do Carl’s Jr. e todos os caras estão comentando o quão gostosa é a modelo, mas eu não me pareço com ela, então eu concluo que tem algo de errado comigo. Quando você consegue mudar a opinião das pessoas e de certa forma ampliá-la um pouquinho que seja e não só mostrar aquilo que representa uma fração minúscula da população feminina, isso altera os padrões e torna mais saudável para todo mundo.
Muitas mulheres que lutam MMA, e atletas em geral, ainda são definitivamente mais sexualizadas do que os homens. Atletas femininas são pressionadas a serem sexies e a também projetar poder. Como você equilibra isso na sua vida?
Bem, eu sinto que isso é uma opção que está disponível pra gente, mas que não é mais realmente obrigatório. Eu me sinto muito encorajada pelo crescimento das mulheres nas artes marciais mistas. Foi alcançado um ponto onde é ok você chamar um pouco mais de atenção [agindo de maneira sexy], mas não é como se isso fosse necessário para vender uma luta ou alavancar as vendas do pay-per-view. É uma outra opção que está disponível pra gente como mulher, como atleta, para vender qualquer evento para o qual estamos tentando chamar atenção. Enquanto isso, os homens nem se quer têm essa chance.
Muitos atletas se aposentam muito jovem, se comparados com profissionais de outras áreas. Quanto tempo mais você está pensando em lutar?
Eu realmente não sei. Não tem a ver com quantidade de tempo ou disputas, tem a ver com o tempo de luta real. Quero dizer que passo 25 minutos lutando dentro do octógono. Essa é a duração total de um campeonato de luta. Então, eu penso em o quanto de estresse eu estou colocando sobre o meu corpo. Quanto mais curtas as disputas forem, mais numerosas serão.
Que tipo de futuro você imagina para a sua aposentadoria?
Essa é a razão pela qual eu estou me metendo a atuar enquanto ainda luto MMA. No judô, eu não pensava em mais nada a não ser nas Olimpíadas. Então, quando eu chegava lá, eu recomeçava do zero. Foi muito difícil tentar fazer outra coisa. Estou tentando acumular o máximo de experiência atuando para quando eu pensar em parar com o MMA. Assim vou conseguir dedicar todo o meu tempo à atuação.
Você irá estrelar o filme biográfico que contará a história de sua própria vida. O que você pode nos dizer sobre isso?
Que será uma mistura de “8 Mile” e “Rocky”.