Delícias calóricas como bolachas recheadas e donuts entraram na mira do governo dos Estados Unidos em junho, quando o país anunciou a proibição do uso de gordura trans em produtos industrializados. Na prática, fica banida a grande responsável por deixar os alimentos mais crocantes, bonitos e saborosos. A FDA (Food & Drug Administration), agência americana reguladora de alimentos e remédios, deu prazo de até três anos para as empresas se adequarem à nova lei. A decisão foi tomada por causa de uma epidemia de infartos e derrames ligados à obesidade. A gordura trans é um dos principais vilões dessa história, pois não traz benefício nenhum à saúde e só contribui para o aumento de peso.
No Brasil, o ingrediente também é usado (e consumido) em profusão. Nos últimos 20 anos, o país se tornou o segundo mercado mundial de venda de pipoca de micro-ondas e lidera a lista dos que mais comem biscoitos doces no mundo. Para tentar contornar a situação, a Abia (Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação) assinou um acordo com o governo federal em 2007, que previa a redução de até 5% do total de gorduras dos alimentos processados e de até 2% em óleos e margarinas. Mesmo assim, os índices de obesidade por aqui subiram 10% em uma década. “Para controlar a questão, de fato precisaríamos de um empenho mundial, como foi com a proibição do gás CFC em produtos aerossóis. Só assim as indústrias removeram a substância das fórmulas”, diz Alexandre Hohl, de Florianópolis, presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem).
Os fabricantes afirmam que já estão se adequando ao novo esquema. A PepsiCo, que detém marcas como Toddy e Elma Chips, informou em nota que segue um plano para eliminar a gordura trans de todos os seus produtos até 2018. A Nestlé tem o mesmo discurso e pretende zerar o uso da gordura até o ano que vem. Segundo o Ministério da Saúde, as discussões sobre a redução do ingrediente serão retomadas e a iniciativa faz parte do plano de promoção de hábitos saudáveis criado em parceria com a Abia e com a Anvisa.
CONHECENDO O ALIMENTO
A gordura trans está presente em alimentos de origem animal, na própria carne e nos derivados do leite. Nesses itens, possui índices toleráveis e menos maléficos. O problema está nos produtos industrializados, nos quais a substância é obtida por meio de um processo químico chamado hidrogenação, que transforma os óleos vegetais líquidos em sólidos. É justamente o resultado dessa alquimia que deixa os alimentos tão atraentes e gostosos.
A partir dos anos 50, toda a indústria alimentícia mundial passou a adotar o recurso. Já naquela época, porém, se especulava sobre os efeitos desastrosos no organismo. Mesmo assim, até os anos 90, ela passou quase despercebida pela patrulha da boa alimentação. “Foi quando começamos a ter um maior suporte científico para afirmar que era justamente esse ingrediente que estava causando tantos danos à saúde cardiovascular”, diz a nutricionista Isabel Jereissati, do Rio de Janeiro.
Além de contribuir para o ganho de peso, o consumo de gordura trans aumenta o processo inflamatório do corpo, eleva os níveis do colesterol ruim (LDL) e reduz o bom (HDL). Para piorar, ao longo dos anos, o ingrediente se acumula nas veias, aumentando o risco de infarto e derrames. Ou seja: uma verdadeira bomba relógio. E não há uma dose de ingestão considerada segura pelos médicos. “Ler o rótulo para se certificar de que não contém trans é uma forma de reduzir o consumo, que deve ser o menor possível”, diz Isabel.
MEMÓRIA NO ALVO
Não é só o coração que sofre com os efeitos colaterais. Uma pesquisa recente feita pela Universidade da Califórnia apontou que o consumo frequente de produtos com a substância também pode acarretar problemas no cérebro, afetando a memória. O estudo foi realizado com mais de mil homens de 20 a 45 anos e mostrou que, a cada grama de gordura ingerido, o voluntário se esquecia de uma palavra das que precisava memorizar.
O resultado preocupou os médicos pela baixa idade dos participantes e levantou uma questão: a gordura trans pode levar ao Alzheimer a longo prazo? Diante disso, pesquisas sobre o tema já começaram a ser conduzidas no mundo todo.
TROCAS SAUDÁVEIS
Para se adequar à proibição, as empresas terão que substituir a trans por outras gorduras, de origem vegetal, como óleo de coco ou de palma. “Os alimentos industrializados vão ficar menos gostosos, chamativos e palatáveis. Mas, sem dúvida, muito mais saudáveis”, avisa o endocrinologista Alexandre Hohl. Enquanto o mercado não se adapta completamente, é possível fazer algumas substituições no dia a dia para reduzir o consumo da trans. Veja quais são os alimentos-vilões e faça trocas espertas: