Homens que respondem a processos pela Lei Maria da Penha, por agressão a suas companheiras, vão participar de um projeto-piloto do Ministério Público de São Paulo de combate ao machismo e a violência doméstica. A iniciativa, inédita no estado, deve começar em setembro com 30 selecionados em Taboão da Serra, a 23 quilômetros da capital.
Autora da proposta, a promotora Maria Gabriela Manssur afirma que a lei, criada há 8 anos, prevê não apenas punição ao agressor, mas o desenvolvimento de políticas públicas de prevenção. “Depois de muitos estudos e experiências com vítimas, vi a necessidade de um projeto com o agressor, voltado para o homem, que às vezes nem sabe que está cometendo um ato violento”, diz a promotora.
Com temas como combate ao machismo, violência contra a mulher e controle da impulsividade, o curso –batizado de “Tempo de Despertar” em homenagem ao ator Robin Williams, morto na segunda (11)- terá sete encontros quinzenais. Os participantes que assistirem a todas as aulas poderão ter a pena atenuada e serão acompanhados por uma equipe multidisciplinar que fará visitas domiciliares após a soltura para verificar se não há novos casos de agressão. Aqueles que cumprem pena não poderão participar, já que as sentenças não podem ser modificadas.
“Quero que eles [os agressores] percebam o que as vítimas sentem quando são violentadas, na parte física, psicológica, da família –a violência a que os filhos também são submetidos e acabam também se tornando violentos- e se conscientizem que são criados em uma cultura machista e patriarcal”, afirma Manssur.
A ideia, segundo a promotora, surgiu quando ainda atuava em Embu-Guaçu, cidade com o maior índice de violência doméstica de São Paulo, onde fundou o primeiro Núcleo de Combate à Violência Doméstica e Familiar do estado. Em Taboão da Serra, onde também coordena uma das unidades da promotoria especializada, ela conta que havia apenas 30 processos de agressões contra mulheres quando chegou. Hoje são mais de 2 mil em curso.
Além do medo e da falta de um serviço especializado em violência doméstica, Gabriela Manssur afirma que muitas mulheres só conseguem denunciar seus agressores a outra mulher, traço cultural que ela acredita que deve mudar. “Sempre faço a comparação: quantos ginecologistas homens existem? Temos que criar a cultura no homem de ser sensível ao tema e na mulher de confiar no homem”, observa.
A promotora espera que o projeto-piloto, que se estende até dezembro, sirva de referência para outras iniciativas semelhantes e que promova a ressocialização de homens e mulheres afetados. “Estou acreditando muito no poder de transformação da pessoa. Às vezes o homem quer ser ouvido. Muitas mulheres pedem: ‘Doutora, eu só quero que deem um susto nele’. Então não vamos dar susto, vamos ensinar. Eles não vão ser reeducados, vai surgir uma nova educação. Nós já nascemos numa sociedade em que homens e mulheres são tratados de forma diferente.”