Em um mundo em que os negócios são, basicamente, dominados por homens, é difícil encontrar mulheres em posições altas e que consigam, ainda, serem reconhecidas como grandes exemplos de liderança. Marie Claire conversou com Sara Parkin, diretora e fundadora do "Forum for the Future" – organização britânica sem fins lucrativos que se dedica a encontrar a soluções inovadoras para os desafios da sustentabilidade e economia do mundo.
Na carreira há mais de 40 anos, Sara visita o Brasil pela primeira vez a fim de divulgar seu livro “O Divergente Positivo”, que será lançado este mês no país. Em entrevista exclusiva, ela fala sobre o papel da mulher no mundo dos negócios e como ela pode influenciar, com sua própria maneira de liderar, e colaborar para a sustentabilidade.
Marie Claire: Como começou o seu interesse pelo assunto “sustentabilidade”?
Sara Parkin: Eu trabalhava como enfermeira nos anos 60 e início dos anos 70, e fui convencida pelos argumentos na época. Acredito que mudei de área pensando que, ao invés de cuidar de alguém na cama, eu estaria cuidando de várias pessoas na Terra.
MC: Antes de se envolver ativamente em projetos de sustentabilidade, você trabalhou por algum tempo como enfermeira. Por que escolheu essa área?
SP: Eu queria ser médica, mas não tinha certeza. Queria começar a trabalhar, então fiz enfermagem primeiro e depois pensei em transferir para medicina, mas me casei, tive filhos e as coisas mudaram.
MC: "O Divergente Positivo" será lançado aqui no Brasil este mês. O que esse nome significa?
SP: Um Divergente Positivo é alguém que faz a coisa certa, neste caso sobre sustentabilidade, apesar de estar cercado de instituições e estruturas erradas e pessoas obstruídas. Depois de muitas décadas, cheguei à conclusão de que a campanha para a sustentabilidade não teve muitas mudanças. Acho que precisamos de uma instituição em que as pessoas se sintam, talvez, com habilidades e valores suficientes para tentar fazer a coisa certa, onde quer que estejam. Cada vez mais pessoas estão fazendo isso! O livro é uma ferramenta de auto-desenvolvimento para dar às pessoas o conhecimento e a confiança para tentar de verdade e encontrar uma maneira de contribuir para a sustentabilidade.
MC: Na sua opinião, quem são as líderes de destaque atualmente e por quê?
SP: Não acho que existam muitas vivas. Wangari Maathai é uma delas. Ela foi uma diplomata queniana que deu início ao Green Belt Movements, que consistia em mulheres indo de vilarejo a vilarejo com milhares de pequenas árvores. Era apenas um projeto de plantar árvores, mas, ao mesmo tempo, as mulheres estavam passando adiante não apenas informações sobre como cuidar das árvores. Ela foi uma grande amiga e morreu, infelizmente, recentemente. Ela foi uma das minhas grandes inspirações. Você não precisa fazer as coisas diretamente, você pode ser discreta sobre como conquista seus objetivos. A outra, também é uma mulher que ganhou um prêmio Nobel, Elinor Ostrom. Ela não era uma economista, mas foi a primeira mulher a ganhar um prêmio Nobel no setor econômico. Essas duas mulheres tiveram um grande impacto em mim. Há muitas mulheres incríveis por aí, atualmente, mas acho que nenhuma delas são muito conhecidas e não consigo pensar em ninguém no governo ou no setor corporativo que eu poderia identificar como uma mulher que está realmente sendo uma boa líder em sustentabilidade. Há mais mulheres chegando a posições de poder, mas ainda estão trabalhando em um sistema muito masculino, então é muito difícil.
MC: O seu livro fala na mensuração da felicidade para avaliar o desenvolvimento das nações. Como é feita essa relação?
SP: Da maneira como se mensura o progresso no momento, se estivermos falando de mensuração global, nacional ou no setor econômico, não se leva em conta o bem-estar das pessoas ou do meio-ambiente. Não há razão em mensurar os planos das pessoas ou o que eles dizem, você tem que mensurar o que eles fazem. E isso contribui para a construção do tipo de capital que será importante no futuro, que seria o capital natural, o capital humano e o capital social.
MC: Qual é o problema mais grave que enfrentamos atualmente em relação à sustentabilidade e como podemos resolvê-lo?
SP: É possível, sim, resolvermos os problemas atuais e uma maneira de fazer isso é entender que não é sobre o meio-ambiente, mas sim sobre as pessoas e o que elas fazem. Nós cometemos o erro de pensar no meio-ambiente, ao invés de pensar no que as pessoas fazem. É muito simples dizer o que temos que fazer. É mudar a maneira como a economia depende de mais pessoas consumindo mais coisas, para uma que dependa de menos pessoas consumindo menos coisas. Esse é o pensamento que a economia precisa ter no futuro. A troca de uma economia baseada em consumismo para uma que se baseia no florescimento das pessoas e do meio-ambiente é, definitivamente, o que precisamos fazer. O problema seria nossa própria capacidade de entender se queremos que as coisas mudem e, então, que temos que fazer com que aconteça.
MC: Em 2010, você escreveu um artigo no jornal The Guardian intitulado “Women can´t ‘have it all’ in a man´s world”, sobre as dificuldades que as mulheres enfrentam para se tornarem líderes perfeitas. O que já mudou neste cenário e o que é preciso mudar ainda?
SP: Acho que o problema é que as escolas de administração e treinamentos de liderança dizem que as mulheres tem que mudar. São as mulheres que tem que se desenvolver para liderar da maneira como os homens fazem e a razão de não ter muitas mulheres em posições altas é porque elas não querem viver uma vida como essa. Eu falo sobre esse triângulo que as mulheres tem, que é sobre nossa auto-estima, relações pessoais na segunda ponta, e relações sociais e profissionais na terceira ponta, e como quando as coisas ficam difícil para nós, sacrificamos a ponta que é sobre nós – nossa auto-estima e nosso desenvolvimento pessoal. Nós equilibramos nossa vida entre a família e o trabalho. Os homens sacrificam as famílias, primeiro, antes de sacrificarem a si mesmos, seu desenvolvimento pessoal e profissional. Acho que as mulheres tem que ser muito claras sobre o que elas querem. Elas querem ter uma vida completa, que incluí o lado pessoal, a família e as relações profissionais, e eu acho que elas conseguem articular isso muito claramente e estabelecer limites, e ajudar as pessoas a entenderem que elas estão fazendo isso. Acho que isso começará uma mudança efetiva. Algumas mulheres no mundo da liderança estão começando a falar sobre isso, mas ainda não está desenvolvido o suficiente em uma maneira feminina de liderar.
MC: Você acredita que essa mudança irá ocorrer?
SP: Sim, irá, porque a maneira masculina de liderar está quebrada. E está quebrada para todos verem. Não sei como está no Brasil, mas na Europa há muitas críticas agora sobre a liderança masculina, que acredita em seu tremendo poder e comete erros terríveis, que não colaboram. Você pode ver essa maneira de liderar falhando, em público. Então não são apenas as mulheres que buscam por um novo modelo, os homens também. E acho que os homens estão começando a ver que existe outra maneira de liderar, também.
MC: O que você sabe sobre a situação atual do Brasil? Como podemos mudar isso no país?
SP: Eu acho que a situação no Brasil é um pouco mais difícil do que na Europa. É esperado que as mulheres se comportem como os homens. Esse é possivelmente o motivo de as mulheres encontrarem tanta dificuldade em cargos altos, pois elas estão tentando como um homem faria. Acho que toda a cultura da liderança precisa mudar. Um argumento positivo é que as mulheres podem se desenvolver para liderar de uma maneira diferente, e que elas podem articular tudo muito claramente para que não exista confusão sobre como elas vão se organizar quando se depararem com um cargo de liderança. Isso será fácil.
MC: Quais são os principais erros cometidos pelas líderes atuais, mulheres que estão no comando de grandes projetos?
SP: Acho que, basicamente, tentar fazer como um homem faria.