A entrevista com Alexandre Borges estava marcada para domingo, 6 de maio. No entanto, um dia antes do combinado, recebemos um e-mail do ator pedindo, gentilmente, que remarcássemos o compromisso, já que justamente naquele dia a atriz Julia Lemmertz, sua mulher, faria a última apresentação da peça “Deus da Carnificina”, e ele gostaria muito de assistir. E dá para negar um pedido desse tipo?
“Eu admiro muito a Julia e acho que esse é um dos ingredientes que faz o nosso casamento ser assim, duradouro”, disse Alexandre no dia seguinte, durante conversa no mezanino do hotel Maksoud Plaza, em São Paulo, onde ele estava hospedado em razão do recital “Poema Bar”. No espetáculo, que já passou por Portugal, Alemanha e algumas cidades brasileiras, como Rio de Janeiro e São Paulo, Alexandre recita poemas de Fernando Pessoa e Vinícius de Moraes:“Vamos agora para Itapetininga e depois Tiradentes, em Minas Gerais. Quero fazer esse espetáculo pra sempre! A gente mistura poema, música e solos de piano. É um projeto que me dei de presente, sinto muito prazer em fazê-lo” , contou.
Em entrevista, Alexandre deu mais detalhes sobre o projeto e falou sobre casamento e maturidade.
Marie Claire: Você está rodando o país com um recital que mescla música, solos de piano e poesias de Vinícius de Moraes e Fernando Pessoa. De onde surgiu a ideia para montar um projeto como esse?
Alexandre Borges: A ideia original é do João Vasco, pianista português que sempre teve inquietação por fazer coisas novas. Como morei em Portugal e sempre viajo pra lá, amigos em comum indicaram meu nome para participar. Em junho de 2011, conversamos e ele me perguntou que poeta eu gostaria de ler no espetáculo. Na hora eu disse que era Fernando Pessoa, especialmente trechos do livro “Poesias Completas de Álvaro de Campos”. Nós nos encontramos em Lisboa e os planos começaram a ficar mais sérios...
M.C.: E o Vinícius de Moraes, onde entra nessa história?
A.B.: Eu sempre tive uma ligação com a família do Vinícius. Fui dirigido pela filha dele, Suzana de Moraes, no meu primeiro filme "Mil e Uma"; já conhecia também a Mariana, que é neta dele, e que depois convidei para cantar no “Poema Bar”. E todas as vezes elas me cobravam para fazer algum trabalho do Vinícius, já que eu até me pareço com ele. Aí achei que cabia colocá-lo nesse espetáculo, já que, assim como o Álvaro de Campos, ele fala muito de boemia, da noite e das mulheres nos poemas.
M.C.: Além da semelhança física, há outra característica que te faz parecido com o Vinícius?
A.B.: Todo artista tem isso de juntar os amigos, beber um vinho, ler um texto. A boemia na época do Vinícius era outra, mais arraigada, as pessoas se encontravam nos bares cariosas famosos, bebiam uísque, cada um falava uma poesia... Hoje isso é um pouco menos, mas eu gosto de ter esse lado. Tem também a minha admiração pela mulheres: sou filho único do primeiro casamento o meu pai, fui praticamente criado só pela minha mãe, tenho 8 irmãs dos outros casamentos do meu pai... Tenho ainda minha enteada, as atrizes com quem trabalho... Mas nunca fui mulherengo! Todos os meus relacionamentos foram duradouros, estou casado com a Julia há 20 anos.
M.C.: Qual o significado do casamento pra você?
A.B.: O casamento nasce de uma paixão e vai se transformando em um caminhar junto pela vida. Nesse tempo de casamento, já tivemos fases diferentes, primeiro o namoro, depois fomos morar juntos, aí nasceu o meu filho, o Miguel, que dá outro significado pro relacionamento. É um casamento feito de incentivo e compreensão do que a é nossa vida, que é cada um estar num lugar, viajando. Sabe aquela velha história de compatibilidade de agendas? Pois é, tem que ter força de vontade para dar certo.
M.C.: Como encara a questão da fidelidade?
A.B.: (Alexandre pensa um pouco antes de responder...) A fidelidade tem uma coisa de você ser sincero com a pessoa que você está e consigo mesmo. É um brilho, um privilégio ter uma pessoa do seu lado e ela te completar, te suprir. Ao mesmo tempo, é preciso também ser fiel nas próprias questões. A vida pode levar para outros caminhos, às vezes num momento em que a relação já é só um rótulo. Eu acredito muito em fidelidade, mas não como um fardo.
M.C.: Com tantas mulheres ao seu redor, qual é a influência do universo feminino no seu mundo?
A.B.: Na relação com o homem, é a mulher que trás o sonho, a fantasia, a leveza, a criatividade, a paz. Ela é fundamental para que o homem possa relaxar, sonhar, rir . A mulher, pra mim, é justamente o que me faz ser mais lúdico.
M.C.: Qual é o principal tabu que as mulheres encaram hoje?
A.B.: É justamente um pouco esse outro lado do homem. Porque hoje a mulher trabalha, é bem-sucedida, é independente, tem que estar linda sempre, e ao mesmo tempo, não trazer a agressividade, a dureza do masculino. Não é um tabu, mas acredito que deva ser uma busca, uma procura interna muito grande para elas, conseguir o equilíbrio.
M.C.: Você está com 47 anos agora. Vive ou viveu a crise da meia-idade? Como lida com a chegada dos 50?
A.L.: Vivo em crise há muito tempo, eu me coloco muito em xeque. Eu não sou uma pessoa que está tudo ótimo, tudo bem. A partir do momento que você descobre que o ser humano é finito, que existe uma coisa chamada morte, percebe que as coisas são temporárias e passageiras. Não quero ser exemplo, não quero ser aquele ator, que está casado há 20 anos, que tem uma família, uma carreira, tudo bonito. A vida não é só isso, é um monte de coisas e eu tenho total consciência que sou um privilegiado, pela minha família, pelo meu trabalho e tudo que conquistei. Mas a crise não significa uma coisa completamente negativa, é mais no sentido de descobrir o que preciso fazer depois de 27 anos de carreira, de questionar se estou em um caminho legal. Serve para eu não me acomodar. É importante não ser superficial.
M.C.: Essa consciência toda te deprime?
A.B.: Hoje em dia, nem tanto. Desde que fui pai, dei uma respirada. Não fico mais tão ligado em questões tão filosóficas, psicológicas. Mas acho que todo mundo sente melancolia, é que a gente tem medo de assumir. A solidão é importante, fortalece.
M.C.: Qual é a parte mais difícil de envelhecer?
A.B.: Não existe outra alternativa, né!? (risos) Tem que tentar se preparar, se cuidar. O mais difícil pra mim, até agora, tem sido perder as pessoas que amo. Muitas pessoas que foram importantes na minha vida, de uns anos pra cá, partiram. E isso é mais complicado do que os cabelos brancos, a barriga. Não tenho essas vaidades. Eu, como ator, sempre quis ser mais velho, ter uma experiência que não tinha. Acho que o mais importante é acompanhar a idade física e não perder o entusiasmo. É inevitável, de vez em quando, pensar: “Será que vou mesmo sair de casa hoje? Viajar?”. Mas eu ainda tenho essa disposição, tenho vontade de sair do conforto. Enquanto eu tiver isso, vou me sentir bem.