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Vinho: enóloga indica o "modo de usar" para mulheres

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A enóloga do momento Victoria Prandina (Foto: Divulgação)

Ela tem 30 anos e produz o vinho mais importante da Trivento, o braço argentino da vinícola chilena Concha y Toro. Victoria Prandina, uma mendozina de fala mansa, é, além de jovem, loira e bonita, a enóloga do momento quando o assunto é malbec, a uva argentina por excelência. O líquido que ela engarrafa é um dos melhores do planeta segundo o ranking do crítico Robert Parker, o maior guru de vinhos da atualidade. Enquanto pontuações maiores de 90 são consideradas ótimas, o Eolo 2008 de Victoria chegou aos 95, o que costuma ser suficiente para criar um pequeno séquito de adoradores.

Na Argentina, ela comanda um vinhedo centenário e uma equipe pequena e tradicional, que inclui três senhores com mais de 75 anos que seguem trabalhando por amor ao terroir. Lá, as mulheres escolhem as uvas na época da colheita e são excelentes vendedoras, mas quando chega a hora das grandes decisões – sobre mesclas e tempo de barril, por exemplo –, Victoria não tem colegas do mesmo sexo. “O ambiente da enologia é muito fechado e machista”, reclama. Mas não é nada que ela, criada entre os vinhedos da família e a cozinha italiana da avó, tenha medo de enfrentar. “Degustação é memória olfativa. Uma mulher pode muito bem reconhecer mais sabores que um homem.”

Conversamos com a argentina em São Paulo durante o lançamento da safra 2009 do Eolo (que chega ao Brasil com preço de R$ 420) sobre a bebida, seus rótulos favoritos e tudo o que você precisa saber – e esquecer – para apreciar a próxima taça.

Marie Claire - Você é bonita e cresceu rápido numa profissão masculina. Ouviu muitos comentários maldosos a respeito?
Victoria Prandina -
Muitos, milhões. Eu já não os ouço.

Marie Claire - Ser mulher atrapalhou sua decisão de ser enóloga?
Victoria Prandina -
Sim. O ambiente da enologia de Mendoza é muito machista, para mim foi bem difícil romper essa barreira. Há de fato muito poucas mulheres que se dedicam à fabricação de vinhos. Na faculdade, havia 60 alunos na minha turma e apenas três eram mulheres. Uma foi para a parte comercial e a outra para a parte de laboratório. Hoje, na Trivento, há seis enólogos. Eu sou a única mulher.

"As mulheres tendem a preferir vinhos mais frescos e “fáceis” de beber", diz Victoria (Foto: Divulgação)

Marie Claire - Como é o seu trabalho?
Victoria Prandina -
Cuido do vinhedo e de parte da comercialização. Escolho as plantas uma a uma e trabalho na elaboração do vinho. É um trabalho associado a homens, mas nós mulheres podemos ser mais sensitivas e abertas para programar uma mistura, definir aromas e sabores. Claro que depende da sua formação mas, no fim das contas, degustação é memória olfativa. Venho de uma tradição italiana forte, minha avó era ótima cozinheira, fazia massa para toda a família e eu sempre participava. Então posso dizer que uma mulher que conhece bem a cozinha pode chegar a captar mais aromas que um homem que não conhece.

Marie Claire - Quando não está provando vinhos a trabalho, qual gosta de tomar?
Victoria Prandina -
Meu preferido é o sauvignon blanc, gosto muito de vinho branco. Entre os tintos, gosto do Malbec, com madeira marcada, que vai um pouco ao encontro do vinho que faço. Mas, em geral, quando estou em casa e com amigos, tomo sauvignon blanc. Adoro o do Chile, do Vale de Casablanca, o da zona sul de Mendoza, do Vale de Uco, e o da Nova Zelândia. É uma variedade que eu realmente gosto!

Marie Claire - Essa história de “vinho feminino” é real?
Victoria Prandina -
As mulheres tendem a preferir vinhos mais frescos e “fáceis” de beber. Claro, há exceções. Eu, por exemplo, gosto de vinhos bem fortes. Mas se você faz uma degustação aberta ao público, as mulheres tendem a uvas como pinot noir, merlot, ou brancos e rosés. Vinhos um pouco mais suaves na boca.

Marie Claire - O malbec é o vinho argentino por excelência. O que o torna único?
Victoria Prandina -
É uma variedade francesa que se adaptou muito bem à Argentina. Em Mendoza, encontrou diferentes microrregiões com características próprias. Mas, no geral, é um vinho com muita fruta, muita estrutura, muita cor. O argentino tem mais corpo e mais força que o de Cahors, na França, de onde a uva é originária.

Marie Claire - Que outros argentinos merecem atenção?
Victoria Prandina -
Entre os tintos, o bonarda e, entre os brancos, o torrontés. O bonarda é muito similar ao malbec, com mais textura, e agora está recebendo a atenção que merece. E temos torrontés muito bons, o de Mendoza é muito floral, gostoso.

Marie Claire - Num restaurante, como escolher um bom vinho numa carta que não conhecemos bem?
Victoria Prandina -
É importante decidir o básico: você quer um vinho mais leve ou forte, tinto ou branco? Aí, sugiro que dialogue com quem serve o vinho no restaurante. Diga o que quer, pergunte mesmo. E, se o vinho vier estranho, devolva. Às vezes a pessoa pede um vinho no escuro, não sabe o que esperar e, ao prová-lo, não gosta e não fala nada. Mas o vinho pode estar na temperatura errada ou com um aroma estranho mesmo. Por isso, é importante falar sem medo. Vinhos mal servidos mancham a imagem de uma vinícola.

"Você tem que sentar com a sua comida favorita e curtir o seu vinho", indica a sommelier (Foto: Divulgação)

Marie Claire - E o ritual de provar? Normalmente, é reservado ao homem da mesa.
Victoria Prandina -
É verdade. Mas acho que ambos devem provar, até porque a mulher pode perceber mais que o homem. Infelizmente, é um costume também muito comum na Argentina que se sirva primeiro ao homem. É machismo, a mesma história de associar o gosto por vinho aos homens.

Marie Claire - Acontece com você?
Victoria Prandina -
Direto. Sempre que saio com o meu namorado, servem o vinho a ele primeiro. Por sorte, ele também é enólogo (risos)!

Marie Claire - E em casa, o que é básico?
Victoria Prandina -
Não acredito em grandes complicações. Se você tem um decanter, fantástico, é algo que serve para todos os vinhos. Você deve tomá-lo numa temperatura amena e, o branco, um pouco mais frio. Além disso, é bom não deixar a garrafa perto do fogão nem perto de uma janela em que bata sol. Só isso. É um grande erro do enólogo e do sommelier tentar “estruturar” muito a coisa, com taças específicas e tal. A minha ideia, quando faço um vinho, é que as pessoas relaxem. Vinho é pra curtir.

Marie Claire - O que vai bem com o Malbec?
Victoria Prandina -
Carnes cozidas e bem suculentas vãoi muito bem. Com cordeiro, por exemplo. Eu gosto muito do Malbec do sul, que é mais condimentado e no qual aparece a pimenta negra. Com massas e um molho bem concentrado vai bem também.

Marie Claire - O que há de novo nas regras de harmonização?
Victoria Prandina -
Aplico a mesma teoria de não se preocupar tanto. Acho que os brancos tendem a comidas mais leves, como saladas, uma tábua de queijos, e os tintos, com comidas mais fortes. Mas há pessoas que comem carnes com brancos e isso é fantástico. Você tem que sentar com a sua comida favorita e curtir o seu vinho. Os sommeliers podem querer me matar por dizer isso, mas é o que procuro quando faço vinho.


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