Misteriosa, sexy e em constante risco, sequestrada durante um enfrentamento com a polícia, Amina Abdallah Arraf al Omari se tornou uma celebridade internacional em 2011, início do conflito na Síria, como a “menina gay em Damasco”.
No país em conflito, o blog assim batizado se tornou a voz do povo sírio, dominado pela ditadura de Bashar al-Assad. Amina trocava mensagens com outra mulher lésbica, que vivia no Canadá e, após relatar as constantes ameaças e o rapto pela polícia secreta, atraiu a atenção até mesmo da Anistia Internacional e do Departamento de Estado dos EUA.
O único problema é que a jovem com cidadanias síria e americana, que publicava posts em inglês, era na verdade o estudante americano Tom MacMaster. A história será recontada no documentário “A Gay Girl in Damascus: The Amina Profile” (Uma menina gay em Damasco: o arquivo Amina, em tradução livre) que chega aos cinemas dos EUA nesta sexta (24) e será disponibilizado no site SundanceNow Doc Club, de acordo com o New York Post. Assista ao trailer:
O longa mostra como o estudante de 40 anos conseguiu enganar toda a opinião pública após ter tido mais de 10 romances rejeitados por editoras. Da investigação para chegar ao seu nome, passando pela intensa troca de mensagens entre Amina e Sandra Bagaria, sua “namorada” de Toronto, a história também disseca como o blog se tornou uma das principais fontes sobre o início do levante na Síria, hoje no quinto ano.
“Que época para viver na Síria! Que época para ser árabe!”, escreveu Amina no seu primeiro post. Uma espécie de Anne Frank da sua época, o relato online da jovem não demorou a atrair atenção global, entre relatos de agressões e bombas de gás em protestos, de como viu uma pessoa ser morta ao seu lado ou de como o pai impediu que a polícia secreta invadisse sua casa para levá-la presa por ser gay.
Enquanto isso, a jovem síria mandava descrições detalhadas de suas fantasias sexuais com Sandra, que se apaixonou por Amina após ler sobre o blog numa reportagem do diário inglês The Guardian –na qual o repórter deixava implícito ter encontrado a blogueira. Uma foto do rosto de Amina logo se tornou um símbolo da resistência no país.
A farsa chegou ao auge após um “primo” da jovem mandar para Sandra um e-mail no qual dizia que Amina havia sido sequestrada por dois homens armados. O desaparecimento de Amina mobilizou a Anistia Internacional e até o Departamento de Estado dos EUA. A campanha Free Amina (libertem Amina) se tornou um dos tópicos mais comentados das redes sociais.
Foi o apresentador Jeremy Paxman, da BBC, que levou a desconfiança da farsa a público ao ser procurado por uma mulher croata, Jelena Lecic, que se deparou com uma foto sua, publicada em seu Facebook, como o rosto da campanha pela libertação da jovem síria. “Então quem é essa pessoa que usa o rosto de Amina sentada ao meu lado esta noite?”, pergutou Paxman no ar.
O site Eletronic Intifada seguiu o endereço de e-mail de Amina e descobriu que as mensagens partiam, na verdade, de uma casa na Georgia, que pertencia a Thomas MacMaster, que estava vivendo em Edimburgo, na Escócia. Estudante de pós-gradução, o americano logo confessou o golpe que enganou meio mundo.
No final do documentário, segundo o New York Post, Sandra Bagaria, a “namorada” canadense de Amina confronta pessoalmente MacMaster, e pergunta por que ele passava horas todos os dias postando como Amina, mandando centenas de e-mails e mensagens de celular. “Porque eu fui o centro das atenções por um momento e pareceu divertido.”