AJUDA MÚTUA ENTRE MULHERES
"Fomos acolhidas como se fizéssemos parte da família", diz Cécile. "Não dava para ir embora tão rápido, a gente ainda tinha muita coisa para se dizer". A língua poderia ter representado uma barreira difícil de superar, mas as meninas de L'Équipée acharam um aplicativo tradutor de voz que funcionou bem. No entanto, a comunicação rapidamente revelou-se bem mais fácil do que se esperava: gestos, risos e olhares foram suficientes.
Todo mundo se ajuda em Noiva do Cordeiro, seja para ajudar uma pessoa a se expressar ou para construir uma casa. Se estiver faltando algo para alguém, outra pessoa dá ou empresta aquilo que falta.
A comunidade está organizada em torno do casarão, onde todos convivem. As casas ao redor servem somente de dormitório. Foi no casarão que as francesas se reuniram à mesa com as habitantes de Noiva do Cordeiro, para um café da tarde tipicamente mineiro (com polvilho e bolinho de chuva). Durante uma hora, elas ouviram a história da comunidade rural de Noiva do Cordeiro, nascida de um romance.
A HISTÓRIA
No final do século 19, Maria Senhorinha de Lima largou o francês com quem tinha sido forçada a se casar, para ir viver com o homem que amava. Acusados de adultério, os dois amantes foram excomungados, assim como seus descendentes de quatro gerações seguintes. Eles construíram um casarão e criaram seus 12 filhos. 50 anos depois, Delina, hoje matriarca de Noiva do Cordeiro, com apenas 16 anos na época, casou-se com um pastor evangélico 27 anos mais velho. Este impôs regras religiosas muito rígidas à pequena comunidade: qualquer forma de conforto foi proibida e os cultos passaram a ser obrigatórios.
A população da região, em sua grande maioria católica, não apreciou nem um pouco a orientação religiosa da comunidade, que foi novamente rejeitada e caiu na miséria. Hoje, Noiva do Cordeiro é um povoado próspero de cerca de 400 habitantes que funciona como uma sociedade à parte, com uma vida realmente comunitária.
DESPEDIDAS EMOCIONATES
Chegou a hora de ir embora para as meninas de L'Équipée. Louise D – muito observadora e sensível, além de ser, das cinco, a que é visivelmente mais conectada com a natureza – ficou extremamente emocionada com esta vida comunitária: "Embora o fato de estar em meio a todas essas mulheres me lembre a infância, quando eu estudava em colégio interno, uma lembrança não muito agradável, eu ainda queria passar uns meses aqui para viver realmente a vida delas, essa relação com a terra, as relações entre elas. É tão emocionante!".
As mulheres de Noiva do Cordeiro se reuniram na frente do casarão e antes de as meninas ligarem as motos, começaram a cantar. Cindy e Pauline não contiveram as lágrimas diante de tanta emoção. "É inacreditável como todos aqui realmente querem bem um ao outro!", disse Cindy. "Esse sentimento de carinho, de família, de irmandade me tocou muito", disse mais tarde Pauline, que recentemente sofreu uma perda muito marcante.
Dois dias não são suficientes para saber como é realmente a vida comunitária em Noiva do Cordeiro, mas uma coisa é certa: essas mulheres corajosas e unidas transformaram o mundo delas e das futuras gerações da comunidade. Para melhor. Fiquem ligados amanha, quando… As meninas de "L'Équipee" viajam mais de 500 km para conhecer Araxá… e seu tratamento de pele com lama negra.
ROSALEE FERNANDES
A líder
Ela tem 50 anos e é uma das filhas mais velhas de Dona Delina, a matriarca de Noiva do Cordeiro. Líder natural das meninas mais novas da comunidade, ela foi uma das responsáveis pelo rompimento dos habitantes de Noiva do Cordeiro com o extremismo religioso. Essa iniciativa foi fundamental para o lugarejo vir a ser o que é hoje. "A grande virada mesmo veio em 2004" diz ela. "Não sei nem como nem por quê, mas o pessoal daqui me convenceu a me candidatar a vereadora e, por incrível que pareça, fui eleita".
Foi a primeira vez que ela realmente saiu da comunidade. "Fui ver o mundo lá fora e me assustei, mas aprendi muito e estudei por conta própria". A vida política, ela não quer mais, mas a experiência ajudou-a a entender melhor como articular projetos sociais para ajudar sua comunidade.
Outro fator que mudou a vida em Noiva do Cordeiro foi a divulgação na mídia a partir de 2008. "Foi fundamental para ficarmos conhecidas e ganharmos respeito, pois até bem pouco tempo atrás, ainda éramos discriminadas por aqui". O terceiro elemento da virada foi o crédito fundiário conseguido com o governo federal, em 2012. "Não foi fácil, mas conseguimos e com esse dinheiro pudemos comprar a terra onde plantamos hoje e os equipamentos necessários para isso". Rosalee reconhece que a vida melhorou muito na comunidade, mas ainda quer mais. "Fico pensando se antes de morrer vou conseguir ver aqui um posto de saúde, uma escola e uma boa estrada para chegar a Noiva do Cordeiro.