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“Sou global, mas ando de ônibus”, diz protagonista da série “Sexo e as Negas”

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"AS MENINAS NÃO PRECISAM CRESCER PARA DESCOBRIR QUE 'BLACK IS BEAUTIFUL'" (Foto: Divulgação TV Globo)

Eu me acho uma mulher negra linda e capaz de conquistar o que deseja”, é assim que Maria Bia, uma das protagonistas do horário nobre da maior emissora do país se define com tamanha simplicidade. Simplicidade essa que fica ainda mais evidente logo nos primeiros minutos de entrevista pelo telefone. “Tá danado aqui, tô no caminho do hotel. Como é que está o seu deadline? Porque minha vida é de global, mas eu to aqui na correria do ônibus.

O papel de destaque, que divide com outras três colegas – Karin Hils, Corina Sabbas, Lilian Valeska – e marca a sua estreia na TV, depois de uma extensa experiência de teatro, não glamorizou a sua rotina, apesar da repercussão. “Estou em um ritmo tão alucinado de gravação, que vou do Projac para casa, da casa para o Projac. Mas tenho escutado muito das pessoas na rua: ‘Olha lá a nega, do Sexo e as Negas’”, conta a atriz de 30 anos.

O programa, aliás, gerou polêmica antes mesmo de ir ao ar. Mais de dez denúncias de racismo foram recebidas pela ouvidoria da Secretaria Especial da Promoção da Igualdade Racial (Seppir). “Acho que as pessoas estranharam um pouco por causa do nome”, analisa a atriz. “Mas depois que ele estreou, muita gente que estava receosa, mudou de opinião. O programa visa enaltecer a mulher negra e dar um colorido diferente para a televisão. É a primeira vez, pelo menos na Globo, que um programa é protagonizado por quatro negras. Eu adoraria ter visto isso antes.

Durante a preparação para entrar no estúdio e dar vida a Soraia, ela falou sobre a importância da série para o empoderamento das mulheres negras, da comparação com “Sexy and the City”, da abertura para mostrar sexo sem tabu e do poder do cabelo afro.

MARIA BIA, KARIN HILS, LILIAN VALESKA E CORINA SABBAS (Foto: Divulgação TV Globo)



“SEXY AND THE CITY” BRASILEIRO
“Acho que o que as duas séries têm em comum é o fato de falar da sexualidade sem tabu. É inovador mostrar, em horário nobre, mulheres donas de seu próprio corpo fazendo sexo sem preconceito e com quem elas querem, na hora que desejam. A nossa sociedade ainda é muito machista, daí a importância do programa. Além disso, ambos os programas mostram as quatro amigas, que são muito glamorosas, cada uma ao seu estilo. Fizemos laboratório na Cidade Alta, de Cordovil [zona norte do Rio],  e as mulheres são todas lindas por lá, muito coloridas, todas de unhas postiças e com um cabelo lindo e bem tratado. São mulheres com as quais eu me identifico muito, porque quando estou nas ‘vacas magras’, sempre separo um dinheirinho para me cuidar. Mulher é mulher em qualquer lugar do mundo, seja em Nova York, seja no Brasil.”

CABELO CRESPO É SÍMBOLO DE PODER
“Ver a série abordando esse assunto e nos deixando assumir nosso cabelo crespo me deixa muito orgulhosa. As pessoas sempre querem domar o cabelo da mulher negra. Por mais que queiram mostrar que ele é crespo, eles sugerem fazer um babyliss e dar uma reduzida no volume. Mas meu cabelo é revolto, selvagem! E ninguém me pede para baixá-lo! Não deixa de ser uma arma de sedução da personagem e símbolo de poder, do mulherão devorador que ela é. E ao contrário do que muita gente pensa, ele é muito versátil. Faço coque, rabo de cavalo, trança, black power. Apesar disso, só aos 20 anos assumi o crespo. Comecei a alisá-lo aos 12. E sempre penso: ‘Por que demorei tanto?’.  Tenho muito orgulho dele e quero me tornar referência. Muitas mães agora me param na rua para dizer que queriam que as filhas deixassem o cabelo natural. Eu sempre aconselho a mostrarem referências de mulheres negras lindas, para elas se reconhecerem e se acharem bonitas. Não quero que elas precisem crescer para descobrir que ‘black is beautiful’. Não tem que ser todo mundo igual, não. O cabelo também é um sinal de poder da raça negra.

"EU ME ACHO UMA MULHER NEGRA LINDA" (Foto: Divulgação TV Globo)

COMBATE AO RACISMO
“Eu acho que o preconceito tem diminuído, mas a passos lentos ainda. No meu tempo não tinha Barbie negra, hoje já tem. Não existia também princesa da Disney negra, hoje sim [Tiana]. Então, acho que esse programa do Miguel Falabella veio para dar um tapa na cara dos racistas, de uma forma que eu nunca tinha visto antes. Para mim, quando nova, faltou referência na mídia. Mas também acho que o racismo só vai acabar por meio do amor e não pelo ódio, por mais clichê que possa parecer. Um dia eu fui fazer uma aula de ballet e tinha uma menina negra me olhando muito. Eu perguntei se ela tinha achando o meu arranjo de cabelo bonito e se queria um também. Ela disse que sim. No mesmo minuto em que coloquei o acessório nela, ela abriu um sorrindo e se sentiu tão bonita. Foi ai que percebi que a gente tem que trabalhar a autoestima dessas crianças.” 

CONHEÇA O SEU VALOR E TALENTO
“Vou te falar por mim, não é qualquer um que abala a minha autoestima, não. Eu me acho uma negra linda e capaz de tudo. Mesmo quando eu vou a algum lugar e dizem, “ah, mas não tem a cota”, penso comigo: “Vou fazer um teste tão bom, que vão me aprovar”. E posso dizer? Isso acontece muito. Já peguei muito papel em teste que me falaram que não tinha vaga. Não desmereço a questão da cota, que, no fim das contas, eu até acho que tem que ter. Muitos amigos meus já foram beneficiados com isso e talvez não tivessem tido a chance sem ela. Mas eu queria mesmo é que não existisse, que todo mundo fosse igual. E isso tem que começar das crianças. Elas precisam crescer fortes e com a autoestima elevada, impedindo qualquer um de diminuí-las. Afinal, elas sabem do seu valor e talento.”

EMPODERAMENTO DA MULHER
“A minha personagem diz sem o menor constrangimento: ‘Eu gosto de sexo, qual é o problema’. Isso é de uma importância única. Precisamos mostrar cada vez mais o empoderamento da mulher, principalmente das negras, na teledramaturgia. E é esse o caminho que estamos abrindo com o ‘Sexo e as Negas’. A mulher real é realmente o que a gente tem mostrado – trabalha, cuida da casa, atende aos filhos. Tem jornada tripla. Não é fácil. E a gente ainda faz em cima do salto, de batom e com a cabeleira linda. Eu admiro todas elas e me considero uma dessas mulheres guerreiras. Elas são donas de suas próprias histórias, batalham por seus planos e sonhos. E isso não interfere no fato de buscarmos o amor da nossa vida. É claro que a gente não depende de homem, mas é muito bom beijar na boca e ter um companheiro para seguir na vida junto, lado a lado.”

 


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