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Fotógrafo transexual documenta processo de mudança de aparência feminina para masculina em série

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A terceira foto feita pelo artista, que anotou, no alto, a quantidade de testosterona a cada semana: "100 mg" (Foto: Divulgação / Wynne Neilly)

O canadense Wynne Neilly é um fotógrafo que se especializou em flagrar, por meio de seus retratos, as diferentes formas de expressão de gênero. Recentemente, ele resolveu voltar o foco para si mesmo e documentar sua jornada de uma aparência feminina para uma masculina.

Batizado de “Female to ‘Male’” (De feminino para masculino), o projeto mostra a transformação do corpo do artista ao se submeter ao tratamento hormonal por meio de fotos, registros da sua mudança de voz e objetos que representam algum momento da jornada.  Nas imagens, feitas a cada semana ao longo de meses –ele continua a fazê-las-, o artista anota a data e a quantidade de testosterona que lhe foi administrada: “100 mg”.

“Eu venho fotografando a comunidade gay/trans em Toronto há algum tempo, mas nunca tive acesso à intimidade de alguém que passa por essa transição física. Eu estava prestes a passar por essa 'segunda puberdade' e tinha certeza que queria fotografar a mim mesmo a cada semana pelo tempo que sentisse necessário“, contou Neilly à Marie Claire em entrevista por e-mail da cidade canadense, onde o trabalho ganhou sua primeira exposição.

Até mesmo o “male” do título do projeto, entre aspas, diz algo sobre a experiência pessoal do fotógrafo, que se identifica como trans e rechaça a ideia de que todos os indivíduos que se submetem a mudanças de gênero querem ser reconhecidos como homem ou mulher, numa perspectiva heterossexual. “Colocar entre aspas põe em xeque o estigma do que significa ser um indivíduo trans masculino, de que há um só tipo de experiência transexual.”

Confira os principais trechos da conversa.

Wynne na sua 24ª semana de transformação, em janeiro (Foto: Divulgação / Wynne Neilly)



Marie Claire - Por que você decidiu documentar seu processo de transição?
Wynne Neilly -
Porque eu me identifico como transexual, um artista visual gay, estou sempre pensando sobre como meus ambientes e experiências gays podem ser traduzidos conceitualmente em arte. Assim que decidi começar a fazer o tratamento hormonal senti que era essa experiência que eu queria ser capaz de olhar para trás e analisar em sua totalidade, em algum momento no futuro. Eu venho fotografando a comunidade gay/trans em Toronto há algum tempo, mas nunca tive acesso à intimidade de alguém que passa por essa transição física. Eu estava prestes a passar por essa “segunda puberdade” e tinha certeza que queria fotografar a mim mesmo a cada semana pelo tempo que sentisse necessário.

MC - Desde o início, você sabia que queria transformar o material em um projeto artístico?
WN -
Eu não tinha uma câmera digital nessa época porque tinha vendido a minha para juntar dinheiro para a mamoplastia [cirurgia plástica de transformação das mamas femininas em masculinas], então usei uma câmera automática bem barata e comecei pedindo a amigos e companheiros de apartamento para tirar as fotos toda sexta-feira (o dia em que tomo a dose de testosterona). Eu não sabia para onde o projeto estava indo quando comecei essa rotina, mas minha prioridade era poder ter uma representação visual dos estágios dessa minha transição. Ao mesmo tempo que comecei a fotografar a mim mesmo, tive contato com os coordenadores e diretores do Ryerson Image Centre [local da exposição]. Depois de verem meu trabalho, chegamos a um acordo que seria uma boa ideia seguir com o projeto e transformar em uma exposição multifacetada da minha experiência.

Neilly na 52ª semana: "É realmente recompensador olhar todas as imagens juntas e ver como mudei" (Foto: Divulgação / Wynne Neilly)

MC - Em geral, transexuais costumam não gostar de ver a imagem ou ouvir a voz antes da transição e você fez exatamente o contrário. Foi um processo difícil?
WN -
Sempre será estranho ouvir minha voz antiga e ver minhas imagens de um tempo atrás, mas isso não me afeta tanto porque eu sei que não pareço nem tenho mais aquela voz. É realmente recompensador olhar todas as imagens juntas e ver como mudei. É o que eu mais gosto no projeto como um todo.

MC - Seus projetos anteriores também examinam expressões de gênero. Você diria que seu trabalho influenciou sua experiência pessoal de algum modo?
WN -
De maneira alguma. Eu sempre fui gay e meu gênero nunca teve nada de binário. Acho que meu trabalho me ajudou a me sentir melhor em ser aberto sobre minha identidade trans, mas definitivamente não teve influência no processo de transição.

MC - Por quanto tempo você já documentou sua transição? Pretende fazer um novo projeto no futuro?
WN -
Não tenho certeza de quando vou parar de documentar. Não vejo nenhuma razão para parar agora e espero continuar a me fotografar pelos próximos anos. Eu certamente quero exibir esse trabalho de novo quando tiver mais material ao longo do tempo.

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Imagem da exposição "Female to 'Male'", que também reúne registros da mudança de voz e objetos pessoais do fotógrafo transexual Wynne Neilly (Foto: Divulgação / Wynne Neilly)

MC - Como tem sido a reação do público nesta primeira exposição?
WN -
Recebi uma maioria esmagadora de reações positivas da exposição. Muitas pessoas tiveram uma reação muito visceral, o que me surpreendeu. É realmente incrível colocar tanto de você e do seu trabalho em um projeto e ver que posso provocar a emoção do público. Tenho tido muito amor e apoio das pessoas aqui de Toronto. É maravilhoso.

MC - Já recebeu algum convite para expor o projeto em outros lugares?
WN -
Ainda não. Espero mostrar este trabalho o máximo possível. Gostaria muito que fosse exposto em outros lugares fora do Canadá.

 


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